1. A evolução política do
Egito Antigo
Período
pró-dinástico: a formação do Egito
O trabalho coletivo deixou de ser uma necessidade no Egito
Antigo, uma vez que cada família passou a ser proprietária das terras que
cultivava. A desagregação das comunidades primitivas ocorreu na medida em que a
agricultura se desenvolveu e os utensílios de cobre foram substituindo os de
osso e pedra até então utilizados. A perda das propriedades por muitas famílias
fez com que aumentasse o número de camponeses dominados pelos senhores
poderosos. Surgiram, assim, pequenas unidades politicamente independentes,
denominadas nomos, cada uma delas governada por um nomarca.
Todos esses acontecimentos ocorreram antes que surgisse o
primeiro faraó — chefe supremo. Por isso, tal fase é conhecida como período
pré-dinástico. Os nomos não demoraram a entrar em choque uns com os outros. Os
nomos menores desapareceram, anexados pelos mais fortes. O represamento das
águas obrigou muitas famílias a abandonar suas terras e ir trabalhar em nomos
vizinhos.
As lutas levaram à constituição de dois remos, um ao sul e
outro ao norte, conhecidos como Alto e Baixo Egito. O reino do sul tinha como
símbolo uma coroa branca e o reino do norte era simbolizado por uma coroa
vermelha.
Por volta de 3200 a.C., um rei do sul, Menés, venceu o
norte e unificou o Egito, colocando em sua cabeça as coroas branca e vermelha.
A capital do reino passou a ser Tínis e Menés tomou-se o primeiro faraó.
O Antigo Império (3200 a 2200 a.C.)
Os sucessores de Menés permaneceram no poder por mais de
um milênio e durante todo esse período o Egito antigo viveu um isolamento quase
completo. O faraó detinha o poder supremo, sendo considerado uma encarnação do
próprio deus Rá (o Sol). Sua presença era imprescindível até para as enchentes
do Nilo, nas épocas certas do ano.
Durante essa fase da história egípcia, a camada sacerdotal
adquiriu grande influência e riqueza. Foram construídas as três grandes
pirâmides de Gizé, atribuídas aos faraós Quéops, Quéfrem e Miquerinos. Na nova
capital, Mênfis, havia grandes estoques de grãos arrecadados ao povo e
rigorosamente vigiados pelos escribas.
Pirâmides de Quéops, Quéfrem e Miquerinos.
Uma nobreza privilegiada cooperava na administração e na
exploração dos camponeses, angariando grande poder. Esse fortalecimento levou-a
a tentar assumir o controle direto do Estado.
Seguiu-se um período de anarquia em que praticamente cada nobre
se julgava em condições de ocupar o trono faraônico; o clero aproveitou-se para
expandir seu poder político, apoiando ora este, ora aquele pretendente ao
título de faraó.
O
Médio Império (2000 a 1750 a.C.)
Nessa fase teve início uma nova dinastia e outra capital:
a cidade de Tebas. O Egito antigo expandiu-se em direção ao sul, aperfeiçoou a
rede de canais de irrigação e estabeleceu colônias mineradoras no Sinai. A
ambição dos nobres e do clero fez com que o cobre fosse buscado fora da África,
tomando o Egito conhecido de outras populações do Oriente Médio.
Alguns povos procedentes da Ásia Menor desencadearam uma série
de ataques em direção ao vale do Nilo. Finalmente, os hicsos, povo semita que
já conhecia o cavalo e o ferro, derrotaram as forças faraônicas do Sinai e
ocuparam a região do delta do Egito, onde se instalaram de 1750 a 1580 a.C. Foi
durante essa dominação estrangeira que os hebreus se
estabeleceram no Egito.
O
Novo Império (1580 a 1085 a.C.)
O faraó Amósis I expulsou os hicsos, dando início a uma
fase militarista e expansionista da história egípcia. Sob o reinado de Tutmés
III, a Palestina e a Síria foram conquistadas, estendendo o domínio do Egito
até as nascentes rio Eufrates.
Portal de entrada do templo de Luxor, construído por Ramsés II, um dos maiores nomes do novo Império Egípcio.
Durante esse período de apogeu, o faraó Amenófis IV
empreendeu uma revolução religiosa e política. O soberano substituiu o
politeísmo tradicional, cujo deus principal era Amon-Ra, por Aton, simbolizado
pelo disco solar. Essa medida tinha por finalidade eliminar a supremacia dos
sacerdotes, que ameaçavam sobrepujar o poder real. O faraó passou a
denominar-se Akhnaton, atuando como supremo sacerdote do novo deus. A revolução
religiosa teve fim com o novo faraó Tutancaton, que restaurou o politeísmo e
mudou seu nome para Tutancamon.
Com a instauração da capital em Tebas, os faraós da
dinastia de Ramsés 11(1320-1232 a.C.) prosseguiram as conquistas. O esplendor
do período foi demonstrado pela construção de grandes templos, como os de Luxor
e Carnac.
As dificuldades do período começaram a surgir com as constantes
ameaças de invasão das fronteiras. No ano 663 a.C., os assírios invadiram o
Egito.
O
Renascimento Saíta (663 a 525 a.C.)
O faraó Psamético I expulsou os assírios e instalou a
capital em Saís, no deita do rio Nilo. A recuperação do período foi marcada
pela ampliação do comércio, graças ao trabalho de alguns soberanos.
As lutas pela posse do trono levaram o Egito à ruína. Os camponeses
se levantaram e a nobreza digladiava-se com o poderoso clero. Novas invasões
sobrevieram: os persas, em 525 a.C., na batalha de Pelusa; o rei macedônio
Alexandre Magno, em 332 a.C.; e os romanos, em 30 a.C., pondo fim ao Egito como
Estado independente.
2. A organização econômica do Egito Antigo
No decorrer de sua história, o Egito transformou-se em uma
imensa civilização presa ao comportamento do rio; a população dedicava-se a
lavrar o solo e a levar uma vida pacífica. Gozando de uma proteção natural,
proporcionada pelos acidentes geográficos — Mar Vermelho, a leste; deserto da
Líbia, a oeste; Mediterrâneo, ao norte; e o deserto da Núbia, ao sul — o Egito
pôde gozar de paz externa durante a maior parte da Antigüidade.
O Egito antigo teve na agricultura a maior concentração de
trabalho, constituindo-se em uma das mais privilegiadas civilizações do Oriente
Médio, considerada o grande celeiro do mundo antigo. As terras mostravam-se
férteis e generosas, favorecidas pelo rio e pela fertilização natural,
beneficiadas pelos diques e canais de irrigação. Ao longo do Nilo estendiam-se
as plantações de trigo, cevada e linho cuidadas pelos felás (camponeses
egípcios), desenvolvendo-se rapidamente graças ao aperfeiçoamento das técnicas
de plantio e semeadura. A charrua, puxada pelos bois, e o emprego de metais
propiciaram grandes colheitas. Teoricamente, as terras pertenciam ao faraó,
porém a nobreza detinha grande parte delas. Enormes armazéns guardavam as
colheitas, que eram administradas pelo Estado. Uma parte da produção chegava a
ser exportada.
O comércio processava-se entre o Alto e o Baixo Egito por
meio de embarcações que subiam e desciam o rio abarrotadas de cereais e
produtos artesanais. A presença da tecelagem, da fiação e a confecção de
sandálias de folhas de papiro, bem como a ourivesaria, propiciaram um
desenvolvimento razoável do comércio interno, uma vez que poucas relações eram
tidas com o exterior.
O pastoreio completava os trabalhos na terra. Rebanhos de
gado bovino e ovino podiam ser vistos nos campos próximos ao rio, cuidados por
pastores.
De um modo geral, a economia egípcia é enquadrada no modo de
produção asiático, em que a propriedade geral das terras pertencia ao Estado e
as relações sociais de produção fundamentavam-se no regime de servidão coletiva
(não se pode, porém, falar em modo de produção servil, aplicável somente ao
sistema feudal). As comunidades camponesas, presas à terra que cultivavam,
entregavam os resultados da produção ao Estado, representado pela pessoa do
rei. Este, às vezes, obrigava os camponeses a trabalhar na construção de canais
de irrigação e barragens, propiciando o desenvolvimento da agricultura e o
sustento precário dos aldeães.
3. A sociedade egípcia
Nessas “sociedades hidráulicas”, a distinção social
começou a se fazer notar quando a luta pela posse das áreas cultiváveis levou a
se defrontarem os camponeses, na posição de possuidores da força de trabalho, e
os proprietários das terras, que delas se apoderaram e as mantinham invocando a
proteção dos deuses e dos sacerdotes.
O topo da pirâmide social era ocupado pela família do
faraó; este, por se considerar um deus encarnado, possuía prerrogativas únicas.
O estamento sacerdotal também ocupava uma posição
invejável, juntamente com a nobreza detentora das terras e do trabalho dos
camponeses. Com o crescimento do comércio e do artesanato, durante o Médio
Império, surgiu uma classe média empreendedora, a qual chegou a conquistar uma
certa posição social e alguma influência no governo.
Os burocratas passaram a ocupar um lugar destacado na
administração, principalmente no que tangia ao recolhimento da produção dos
camponeses. Havia toda uma hierarquia de escribas, cujo grau variava de acordo
com a confiança neles depositada pelo faraó e nobreza.
Os artesãos ocupavam uma posição inferiorizada, junto aos
camponeses. Estes eram fiscalizados por funcionários especiais.
Apesar de o governo manter escolas públicas, estas
formavam, em sua maioria, escribas destinados a trabalhar na administração do
Estado Faraônico.
A imobilidade e a rígida hierarquização são marcas essenciais da sociedade egípcia antiga.
4. A vida religiosa e o politeísmo no Egito Antigo
A religiosidade dos povos orientais pode facilmente ser
aquilatada por uma constatação atual, pois as cinco grandes religiões de nossos
dias tiveram suas origens no Oriente. Uma enorme variedade de deuses, fórmulas
religiosas e cultos são provenientes dessas regiões.
A existência dos deuses satisfazia à ânsia do homem em ver
atendidas suas aspirações e ao mesmo tempo afastava seus temores íntimos.
Protetores da água, da chuva, da colheita, das plantas, dos pescadores, eram
todos cultuados por formas que iam desde o incenso até ao sacrifício de animais
e homens, tudo com intenção de conseguir suas boas graças. Os próprios
governantes se revestiam de caracteres divinos a fim de serem mais respeitados.
Paralelamente à instituição religiosa, estruturaram- se os sacerdotes, uma
camada fechada que cresceu em praticamente todas as civilizações antigas. O
clero ocupava uma posição social e econômica privilegiada, influenciando o
governo e o povo.
No Egito antigo, como em quase toda a Antigüidade, a
religião assumia a forma politeísta, compreendendo uma enorme variedade de
deuses e divindades menores.
No Egito, muitos animais gozavam de um culto todo
especial, como era o caso do gato, do crocodilo, do íbis, do escaravelho e do
boi Apis; havia também divindades híbridas, com corpo humano e cabeça de
animal: Hator (a vaca), Anúbis (o chacal), Hórus (o falcão protetor do faraó).
Havia ainda deuses antropomórficos, como Osíris e sua esposa Isis.
O Mito de Osíris ilustra bem a religiosidade dos egípcios,
a ponto de terem se decidido a erigir túmulos e templos em homenagem à morte e
à vida futura.
O principal deus egípcio era Amon-Ra, combinação de duas
divindades, e que era representado pelo Sol; em torno dele girava o poder
sacerdotal. A preocupação com a vida futura era grande e os cuidados com os
mortos eram contínuos, bastando lembrar as cerimônias fúnebres, nas quais se
realizavam as oferendas de alimentos e de incenso.
Acreditava-se em um julgamento após a morte, quando o deus
Osíris iria colocar em uma balança o coração do indivíduo, para julgar seus
atos. Os justos e os bons teriam como recompensa a reincorporação e depois
iriam para uma espécie de Paraíso.
O trecho abaixo, extraído do Livro dos Mortos dos
egípcios, descreve o júbilo daquele que foi absolvido pelo tribunal de Osíris:
“Salve, Osíris, meu divino pai! Tal
como tu, cuja vida é imperecível, os meus membros conhecerão a vida eterna. Não
apodrecerei. Não serei comido pelos vermes. Não perecerei. Não serei pasto dos
bichos. Viverei, viverei! As minhas entranhas não apodrecerão. Os meus olhos
não se fecharão, a minha vista permanecerá tal como hoje é. Os meus ouvidos não
deixarão de ouvir .
A minha cabeça não se separará do meu
pescoço. A minha língua não me será arrancada, Os meus cabelos não me serão
cortados. Não me serão raspadas as sobrancelhas. O meu corpo conservar-se-á
intacto, não se decomporá, não será destruído neste mundo.”
A experiência monoteísta
A experiência monoteísta
Por volta de 1360 a.C., o Egito antigo viu nascer o
primeiro culto monoteísta — o culto a Aton. Afirma-se que foi a primeira
religião monoteísta da História, sendo mesmo ante- flor à dos hebreus. O
politeísmo entravava o progresso egípcio, pois a camada sacerdotal era muito
grande e sua manutenção resultava onerosa para o Estado. Os sacerdotes
interferiam constantemente nos assuntos políticos e o próprio faraó, muitas
vezes, não passava de um joguete do clero. Aproveitando-se da religiosidade do
povo, os sacerdotes alcançaram uma extraordinária ascendência, convertendo a
civilização egípcia como que em sua propriedade particular.
O perigo do poder clerical foi sentido por Amenófis III que, para se livrar da influência do clero, mudou seu palácio para longe dos templos.
O perigo do poder clerical foi sentido por Amenófis III que, para se livrar da influência do clero, mudou seu palácio para longe dos templos.
Contra a tradição politeísta levantou-se o faraó Amenófis
IV, que instituiu uma nova religião, com o culto dedicado a um deus único: Aton
(o disco solar). Esperava com isso quebrar o poder da camada sacerdotal.
Organizou um novo clero e mudou sua capital para a cidade de Aquetaton,
“horizonte de Aton” (atual Tell ElAmarna). Trocou seu nome para Akhnaton,
“servidor de Aton”, e compôs um Hino ao Sol. Essa tentativa monoteísta, porém,
foi efêmera. Com a morte de Amenófis, as coisas voltaram ao estágio anterior e
o clero e a nobreza recuperaram sua influência.
Akhnaton realizando o culto ao sol.
5. A herança cultural do Egito Antigo
Muitos edifícios construídos no Egito antigo chegaram até
nós em bom estado de conservação. Pirâmides, hipogeus, templos e palácios de
dimensões gigantescas atestam a importância da arquitetura egípcia.
Tendo-se voltado para a vida coletiva e religiosa, as
construções egípcias são marcadas pela grandiosidade dos templos e dos túmulos.
Os templos de Carnac e Luxor nos dão mostras de como a arte e a religião
estavam interligadas. A solidez, a grandiosidade e os artifícios procurando
exaltar o volume são as características mais salientes dessas obras. Estátuas
de deuses e faraós acompanham essas dimensões, com decorações esculpidas e
pintadas descrevendo episódios ligados às figuras representadas.
A pintura egípcia prendeu-se principalmente a temas da
Natureza e da vida cotidiana, sendo muitas vezes acompanhada de hieróglifos
explicativos.
A invenção da escrita propiciou o desenvolvimento da
literatura. A escrita ideográfica, nascida no Egito, iria evoluir para o
alfabeto fonético com os fenícios. Utilizando três formas de escrita
(hieroglífica, hierática e demótica), os egípcios deixaram-nos obras religiosas
como o Livro dos Mortos e o Hino ao Sol, além da literatura popular de contos e
lendas.
A decifração da escrita egípcia foi feita por
Jean-François Champollion que, observando e comparando os diversos tipos de
escrita encontrados em um achado arqueológico, estabeleceu um método de leitura
graças ao grego arcaico que também se encontrava no texto. Surgiu assim a
ciência conhecida como Egiptologia, a qual vem constantemente evoluindo com
novas descobertas e restaurações.
As ciências exatas também tiveram oportunidade de
expansão, uma vez que as necessidades de ordem prática forçaram o
desenvolvimento da Astronomia e da Matemática. A Geometria desenvolveu-se pela
necessidade de se redemarcarem as terras quando as águas do Nilo voltavam a seu
leito. A Medicina, por sua vez, está de certa forma ligada à própria prática da
mumificação, o que a levou a um desenvolvimento razoável; por outro lado, a farmacopéia egípcia notabilizou-se por
sua variedade. Havia instituições de sacerdotes-médicos e os papiros atestam o
regular conhecimento de doenças e a própria especialização da atividade médica.
A mumificação constituiu uma técnica de grande importância
na civilização do Egito antigo. Os métodos, até hoje pouco conhecidos,
produziram resultados notáveis, que se podem ver em museus de diversas partes
do mundo.
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